a morte
A morte de Steve Irwin dá que pensar. Não era uma personagem televisiva (e, aqui, "personagem" não é inocente) de grande reputação cultural, mas havia realmente algo de interessante na sua postura. Com ele, o espectáculo não era da Natureza em si mesma - os seus documentários não eram um BBC Vida Selvagem; quanto muito, seriam BBC Vida de Steve Irwin. Não era um David Attenborough, fascinado pela observação de uma beleza exterior. Era, sim, um equilibrista, um artista de circo, que andava permanentemente em acrobacias na corda bamba, mas que transformara a corda bamba em animais perigosos e indomados (o nosso fascínio quanto à sua forma de espectáculo não assentava no seu domínio, como acontece relativamente ao do domador; pelo contrário, assentava na sua vulnerabilidade e, por isso mesmo, a identificação com o comum mortal era muito fácil). Ou seja, enquanto o documentário de Natureza convencional aspira à Biologia, o programa de Steve Irwin aspirava ao circo. Foi o mais carismático representante de um formato televisivo que resulta - e isto, sim, é interessante, talvez mais do que o próprio formato - de uma representação da Natureza enquanto agressiva e adversa à presença humana; por outras palavras, um formato que pergunta o que acontecerá se o observador oculto sair do esconderijo. Da primeira vez que o vi, o homem estava a deitar-se num ninho de dragões de Komodo, lagartos de 2 metros que têm a língua infestada de bactérias. Isso pode não ser grande televisão, mas merece respeito. Ou, pelo menos, alguma consideração.
1 Comentários:
Todos estes rapazes radicais que agora aparecem nos documentários inspiraram-se em Timothy Treadwell, que fez furor há uns anos nos Estados Unidos. Fez furor até ter sido devorado por um urso muito mais radical do que ele na reserva de Katmai, no sudoeste do Alasca. É claro que este estilo é uma receita televisiva garantida, mas muitos biólogos conscienciosos opõem-se à pesquisa-espectáculo, na medida em que (muitas vezes trabalhando em reservas naturais) há impactos muito negativos para os animais e para os homens (como por exemplo a habituação de espécies perigosas ao contacto com humanos e a consequente aproximação destas espécies de zonas habitadas). A interacção com a vida selvagem nunca acaba bem. Que sirva de exemplo ao maluco inglês e ao americano histérico.
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