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as imagens

Qualquer pessoa que pense em cinema, mais cedo ou mais tarde, sente aquilo que o João Lopes brilhantemente verbaliza assim:
Nunca vos aconteceu? A beleza de um filme fazer-vos desejar, não que se apresse a revelação do seu mistério interior, mas o contrário: que cada momento, cada imagem possa cristalizar no espaço da nossa visão, permanecendo ali como coisa imponderável, encantatória, que se basta a si própria. Não porque as imagens de um filme se devam medir por qualquer razão "pictórica"; antes porque nelas podemos encontrar a metódica decomposição do mundo das ilusões e aparências, atingindo algo que, à falta de melhor, diremos que está algures muito fundo — nas águas e no coração.

a publicidade

Já devia estar à espera: também vai haver música distribuída gratuitamente na Internet. Por enquanto, é a Universal, mas aposto que não demorará muito até que o resto das gigantes discográficas (e não só) entrem no esquema. Já há publicidade nos livros. Agora havê-la-á em canções. Eu não tenho nada contra isto e espero que os anunciantes portugueses percebam o valor do sistema. Mas pergunto: haverá mercado para todos? Não voltaremos a ter uma bolha a arrebentar?

a anti-cunha

o jornal

Perante este post do Francisco José Viegas, apetece perguntar se não será ainda pior quando o público leitor já diz que o Expresso não tem nada para ler antes de reduzirem a mancha de texto...

a estupefacção

as palavras

a monotonia

meanings of life

Há um espaço enorme com silêncio, ouço-o, pressinto-o na fronteira da pele como a vertigem ao pé da água. Estar prestes a cair, ligar as luzes como se se quisesse dizer alguma coisa a alguém, não saber o que marcar e perder-se nos pára-sóis da vertigem: não é opção. O gato gordo vai percorrer as vielas mais uma vez. Vai encontrar mais papéis em avião do que em branco, vai passar ao lado da comida dourada, vai pensar em encontrar-se no caminho: não é opção. O espelho reflecte o quê, pensa ele, e, ao pensar em espelho, pensa em contornar o absurdo de carro e no que o rapaz viu há pouco, um velho a falar de dinheiro, um velho a falar de palavras. A memória, "it's a bitch", pois é, mas ao menos eu sei como dar-lhe a volta - será que sei? Eu gostava de saber o que tu fazes e é admirável, disse a mulher, franjinha-à-beatriz, mas isso não vale um chavo, não faz mal, eu completo. O gato, sim, sempre na viela. Há um homem, costas nuas, ele vigia-o, certifica-se de que nada de desrespeitável acontece. Afinal, são as festas do mundo e é preciso ter cuidado, afinal, tudo está no Sul, não é, o grande sul das coisas todas. E o homem pensa que deve, talvez, punir o pai, sanar o pecado capital na raiz e limpar as crostas das feridas nocturnas. O gato gordo vai percorrer as vielas mais uma vez, eu digo-vos, sublinho-vos a frase com tinta azul nas testas até que seja a vossa dor una,  sana, carbónica e  apostrófica . Andaste a comprar com o passado nada mais do que o direito de dizer homem e mulher, tudo se resume a isso. Apetece insultar-te, filho da puta, filho sujo de um monte de lama e merda, terás sempre dentro de ti aquilo que és, aquilo que és sempre a chamar-te para a razão do que existe, a razão do que se te assemelha. Apetece gritar o teu nome, filho da puta, contar o teu segredo mais sujo, e tu tens segredos sujos, aquilo que nunca contas, os dedos partidos num pátio, era noite e tu não sabias viver muito bem, mas há pior no que dizes, tu sabes.  Revelas e escondes na mesma medida. És um animal. Comes peixes pequenos. Improvisas o futuro só para ti, esqueces-te do monte de escrúpulos, ai a herança, ai a cruz. Para baixo, cabrão. O gato percorre a viela como um junkie com uma anilha, ele sabe tratar de ti, ele sabe tratar de ti, o gato gordo, poderoso, preto, borracho do teu medo, fungagueiro, focinhudo.  Tens medo do quê, afinal? Foda-se. Aprende, sai de ti por um momento, dá uma volta e pára a cantoria, que não posso mais. Pensas em muito, mas és pouco no teu pensar. És um fraco, um cobarde. Venderias a tua carne a um talho se tivesses uma faca - se tivesses uma faca, não te saberias cortar. Estás enredado em tanto de ti que não sabes outra língua, falas em Tipróprio, és ignorante entre os outros. Olha para mim. Foda-se, olha para mim. O gato passa, vê, tenho o reflexo nos olhos. Nunca irás perceber. És fraco demais, vais perder, ele está já onde as tuas palavras não chegam a dizer que és tu e que é adorável. Perdeste o nome, perdeste a língua. Tu não és tu.

a fotografia


"Fortuno Sorano. Companheiro de Zapata e Pancho Villa durante a revolução mexicana, perante o pelotão de execução" 1911.

Quebro o hábito recente de não postar imagens só por uma vez. Esta, de autor desconhecido, foi escolhida há uns anos por Cartier-Bresson como a sua fotografia do século. Percebe-se porquê, não?

o antiamericanismo

Mais ninguém devia poder voltar a dizer a palavra antes de ver as entrevistas de Rick Mercer (em 1, 2, 3, 4, 5 partes)

a curta

a pirataria

Certeiríssimo, o João, a escrever sobre a pirataria de filmes. Assino por baixo.

a canção

Não deixa de ser interessante rever este vídeo de início de carreira dos Wham à luz dos desenvolvimentos posteriores da vida de George Michael...
Young Guns,
Having some fun
Crazy ladies keep 'em on the run.
Wise guys realize there's danger in emotional ties.
See me, single and free
No tears, no fears, what I want to be.
One, two, take a look at you
Death by matrimony!

a técnica de vendas

Se a revelação de Günter Grass deu em quase esgotar uma edição de 150 mil exemplares num dia, então, meus amigos, eu também fui nazi. E ruim. Bem pior, pelo menos, do que esse Grass, que se fartava de levar coça na recruta. De onde acham que vem o nome "tambor"? Eu era tão mau, tão mau, que cozia os prisioneiros em água antes de os levar ao forno.

E também fui toxicodependente.  E prostituto travesti. E queirosiana loura com vida sexual. Chega? Serei aquilo que quiserem que seja, safados. Basta que comprem.

os limites

A este post do Tiago Barbosa Ribeiro
SANGUE E TOUROS. A 14 de Agosto de 1936, as forças franquistas tomaram Badajoz. Nos dias seguintes, os republicanos que lá se encontravam foram executados em massa na Praça de Touros da cidade. Uma das mais bárbaras guerras civis do século XX começava verdadeiramente ali. Na arena.
fiz o seguinte comentário
Mas mataram-nos a pé ou a cavalo?
o que, pelo que vejo, mereceu já que uma leitora considerasse o comentário infeliz. Gostava de conhecer mais opiniões: é legítimo ou não fazer humor com um acontecimento trágico que aconteceu há 70 anos? E deixem-me rematar com uma piada do Andy Borowitz:
Speaking before an audience of thousands at the Nuremberg Rally of 1936, Hitler departed from his prepared text to share one of his favorite jokes. “A patient complaining of a sore throat goes to see a doctor,” Hitler began. “After examining him, the doctor says, ‘Your tonsils have to come out.’ The patient says, ‘I want a second opinion.’ So the doctor says, ‘O.K.—you’re also of an inferior race.’ ”
Para ajudar a pensar: estava consciente de que o tom do comentário não era o mesmo do blog do Tiago, mas achei que o comentário se impunha e, por isso mesmo, dirigi-me directamente ao autor no final; Borowitz é judeu; qual foi a sua posição durante a crise das caricaturas de Maomé?

o reverso

Será que matámos o tempo?
Este é o reverso desta medalha.

o site de livros

Tenho a impressão que a Wowio ainda vai dar muito que falar...

o novo

Mesmo agora, um barulho estranho fez-me levantar os olhos do computador. Já era esperado, mas não sabia que já seria à noite.

Está a chover.

Do que estão à espera? Levantem-se e vão cheirar a terra molhada. É bem melhor do que eucalipto queimado...

a perda

A NASA perdeu as cassetes originais da viagem da Apollo 11.

Chama-se a isto andar com a cabeça na...

(vá, digam todos!)

O que nos vale é o YouTube, porque se fôssemos confiar nestes engenheiros aeronáuticos...

a impressão

Porque é que a Fundação Nobel é pressionada para retirar prémios Nobel da Literatura por razões políticas (e nunca o faz) e simultaneamente acusada de atribuir prémios Nobel da Literatura com razões políticas? É impressão minha, ou a Fundação Nobel tem as costas largas?

a estranheza

o filme

Robin Williams a fazer uma espécie de Jon Stewart que vence as eleições presidenciais? Isto tem muito bom aspecto.

a dúvida

Um escândalo: Günter Grass foi nazi. O que se seguirá? Ser Papa?

o filme

Há momentos, passou o Batman Regressa na Rtp1 (por acaso, estava a passar ao mesmo tempo no Hollywood - viva a programação atenta). Algo curioso: a cena em que o Homem-Morcego e o Pinguim estão a discutir. Batman já sabe que o Pinguim não é o santo que diz ser, o Pinguim já sabe que o Batman sabe. A Catwoman surge do nada, eles olham-na, ela aproxima-se, mia e, de repente, a loja por trás dela explode.

Pense-se nisto: os dois homens interrompem a prática da sua inimizade para se depararem com uma mulher que tanto lhes mia como lhes arrebenta lojas na cara. Ou seja, Batman e o Pinguim compreendem-se enquanto opostos um ao outro, mas não se compreendem relativamente à Catwoman. A partir destes dez segundos de cena, podia-se fazer um tratado sobre geografias emocionais, sobre tudo aquilo que separa os homens das mulheres e porque é que os dois sexos não foram feitos para se entenderem - mas já é muito tarde...

o explosivo líquido 2

Se todos os anos cai um avião cheio de crianças nas estradas portuguesas, não devíamos tirar-lhes os IPods antes de embarcarem?

o explosivo líquido

Finalmente, pá: donos de bares, podem rebaptizar os vossos shots.

a guerra

Tenho-me mantido silencioso relativamente à guerra de Israel. O que se pode dizer, ao fim e ao cabo? A discussão que tenho lido por aí passa pelo anti-semitismo, oposição de extremismos, a linhagem histórica do problema, o certo e o errado. Terá sido certa a intervenção de Israel? Terá sido proporcional à ofensa - a propósito, que é dos soldados israelitas raptados? Bem, só por causa de um homem, guerras têm começado (I GM) e acabado (Angola). Mas, se não é proporcional, como deveria ser? Seria possível atacar só um bocadinho o Líbano? Dever-se-ia não ter atacado, ponto? E os civis, são escudos humanos? É Israel que mata indiscriminadamente ou é o Hezbollah que os coloca lá para dizer que Israel mata indiscriminadamente?

As questões mais óbvias parecem-me ser estas. Mas, mais uma vez, olhando para isto, penso: de que adianta? Estarei a ser demasiado ingénuo ao considerar como masturbação intelectual uma discussão de política geoestratégica quando o que está em causa é a aniquilação de pessoas por pessoas? Não adianta muito vir chorar depois o esvaziamento moral e a crise de valores e ai que a culpa é toda do Nietzsche. O que dá a um Estado, a uma organização paramilitar, a um soldado, a um indivíduo o direito de interromper o acesso de um corpo humano à vida através de uma acção violenta? Isso não pode ser negligenciado, não pode. De que adianta vir depois falar de Arendt e Popper e do totalitarismo e do fim da poesia depois de Auschwitz? A verdade é que a guerra excita. Há quem, de súbito, tenha algo de que falar e muito para dizer. Cita-se Arendt e Popper, Said e Malouf, Ash e Hitchens. Fala-se de batalhas. A silly-season já não é silly. Há felicidade na Comunicolândia.

Os mortos devem ser respeitados e a guerra deve ser reprovada. As palavras medem-se e o silêncio vale mais do que mil imagens. Somos pessoas, raio - a nossa dignidade julga-se perante o sangue dos outros.

o fugitivo

Li uma notícia no jornal há dias que me deu que pensar: um fugitivo, acusado de homicídio, entregou-se depois de andar a escapar à polícia há 11 anos. Disse que não aguentava mais a vida que levava.

E agora? Mandamos um homem reabilitado para a cadeia a bem da prevenção geral, vulgo susceptibilidades?

a série 3

E não é que num dos extras dos dvd's o próprio Mark Frost admite que baseou Dale Cooper em Sherlock Holmes, fazendo assim um triângulo com a personagem House, como bem notou o Mário Almeida?

a série 2

O que também ando a ver é a primeira série de Twin Peaks - e o curioso nas personagens é que elas são muito mais pretextos para um discurso do que individualidades. Ou seja, abaixo o naturalismo: aqueles miúdos de escola não são miúdos de escola, o agente especial Dale Cooper pode muito bem não ser agente, o dispositivo está todo à mostra e a história pode muito facilmente ser contextualizada numa cidade grande, aquelas palavras podem muito facilmente ser postas nas bocas de elementos de um sindicato do crime. O contexto tão separado do resto - e, ainda assim, tudo funciona, principalmente porque se investe numa ideia de uma imagem enquanto chave, a que eu chamaria parcial, porque denuncia a presença de um terceiro manipulador entre ela própria e o espectador.

a impressão

O que muita gente não percebe é que ninguém gosta de ficção por ser mentira: gosta-se de ficção por ser verdade.

o aluguer de automóveis

A aventura do Eduardo Pitta lembra tanto este diálogo do Seinfeld...
Agent: I'm sorry, we have no mid-size available at the moment.

Jerry: I don't understand, I made a reservation, do you have my reservation?

Agent: Yes, we do, unfortunately we ran out of cars.

Jerry: But the reservation keeps the car here. That's why you have the reservation.

Agent: I know why we have reservations.

Jerry: I don't think you do. If you did, I'd have a car. See, you know how to take the reservation, you just don't know how to *hold* the reservation and that's really the most important part of the reservation, the holding. Anybody can just take them.

Agent: Let me, uh, speak with my supervisor.

The agent goes into an office with a window in the door so she can be seen speaking with someone.

Jerry: Uh, here we go. The supervisor. You know what she's saying over there?

Elaine: What?

Jerry: Hey Marge, you see those two people over there? They think I'm talking to you, so you pretend like you're talking to me, okay now you start talking.

Elaine: Oh, you mean like this? So it looks like I'm saying something but I'm not really saying anything at all?

Jerry: Now you say something else and they won't yell at me 'cause they thought I was checking with you.

Elaine: Okay, that's it. I think that's enough, see you later.

The agent returns.

Agent: I'm sorry, my supervisor says there's nothing we can do.

Jerry: Yeah, it looked as if you were in a real conversation over there.

Agent: But we do have a compact if you would like that.

Jerry: Fine.

Agent: Alright. We have a blue Ford Escort for you Mr. Seinfeld. Would you like insurance?

Jerry: Yeah, you better give me the insurance, because I am gonna beat the hell out of this car.

a série

Eu não acho que House seja uma série de excepção - afinal, não arrisca assim tanto: a lógica que rege o funcionamento dos episódios tem poucas variáveis -, mas é, isso admito sem problemas, uma série interessante. Já não falo no excelente Hugh Laurie (quem disse que os cómicos não sabiam representar?, grande trabalho de composição). Penso apenas na premissa: um drama de hospital que se organiza formalmente como um drama policial, ou melhor, de lógica e dedução. Daí vem a sua originalidade. Em rigor, House não é nem um drama de hospital nem um policial - por isso deixa uma marca tão distinta.

o músico

O Youtube desvenda (aqui e aqui) a primeira aparição televisiva de Frank Zappa. Tinha 23 anos e só três o separavam do primeiro álbum (o tal que ultrapassou o Sergeant Pepper em ser o primeiro conceptual).

o que apetece dizer 2

Perante este estudo que diz provar que os adolescentes que ouvem músicas tesudas perdem os três mais cedo, coloco duas perguntas:
1. Será que a música tem algum carácter demoníaco particular ou será razoável afirmar que qualquer adolescente sujeito a constantes estímulos sexuais de qualquer origem ou meio se sentirá mais estimulado a começar a vida sexual?, e
2. Não podemos também razoavelmente afirmar que qualquer pessoa (e não só adolescentes) que seja sujeita a constantes estímulos sexuais se sentirá mais, digamos, excitada? A menos, claro, que essa pessoa seja um investigador a trabalhar em estudos do tipo deste. Tantas tretas tiram a tusa a qualquer um.

o que apetece dizer

Quando chegam os incêndios, já ninguém se importa com o país, foda-se? E se as árvores mandassem pôr bandeiras nas varandas, já dava!?

as impressões de viagem

Quando se chega a Maputo, é impossível não reparar no lixo, que parece acumular-se pelas ruas de modo incontrolável. Depois, vem-se a saber que aquilo, afinal, não foi sempre assim e que, curiosamente, tem vindo a piorar desde que o município passou a cobrar uma taxa de lixo para financiar a recolha. Ou seja, a população de Maputo sente que está a pagar pelo lixo que lhe ocupa as ruas.

O lixo de Maputo serve como metáfora para o que me pareceu o maior problema de Moçambique: o laxismo, a sensação indiscriminada de que, a menos que se tome a iniciativa, algo dificilmente será feito. Esta impressão não pretende, claro está, englobar toda a gente: como impressão, anula o indivíduo e realça o geral com superficialidade q.b. Por outro lado, a colonização portuguesa tinha de ter deixado alguma marca: que outro país podia ter legado o "deixa andar" e a ânsia quase trágica de encontrar seriedade numa estrutura político-burocrática que tende a pôr perigosamente a forma à frente do conteúdo?

Moçambique ganha quando sacode os complexos e deixa vir ao de cima a convicção comovente de que há um país por construir. Há quanto tempo é que nós, europeus, inchados e cosmopolitas, perdemos esta noção: a de que Portugal é aquilo que fizermos dele? E há quanto tempo nos esquecemos da nossa língua, que no Sul é, talvez, o elemento mais importante para ajudar a definir uma coesão nacional sobre as culturas e tradições regionais? A vontade, naquele país, de seguir em frente é estarrecedora. Tínhamos todos muito a aprender uns com os outros.

a rádio

Sim, e se os aparelhos para ouvir rádios da Internet já existem, não faltará muito para que possamos andar num mundo em que a rede wireless permita, por exemplo, andar de carro em Portugal enquanto se ouve uma rádio iraniana.

o encerramento dos Cinemas Avenida

Posso estar a cometer alguma injustiça (para centenas de posts atrasados, não há atenção que resista), mas fiquei algo surpreendido por não ter ainda lido nada, nem em blogs, nem na imprensa, sobre o encerramento dos cinemas Avenida em Coimbra. Há já algumas semanas que, em vez de cartazes, se encontra afixada uma simples nota que afirma que os cinemas estão encerrados até novas ordens da direcção de Lisboa. Ora, uma vez que, há uma semana, quando ainda estava em Maputo, essa mesma direcção me ligou a perguntar se queria cancelar o meu cartão King Kard devido ao encerramento definitivo das salas, presumo que não haja muitos desenvolvimentos a dar à história.

É triste. A tentativa de dar um impulso renovador aos Millenium, apostando numa programação alternativa à da "invasora" Lusomundo (que, com a abertura dos centros comerciais Dolce Vita e Fórum, conseguiu, em menos de um ano, abrir vinte salas em Coimbra), não deu resultado. Pelo que pude observar, os cinemas ainda tiveram, no ano passado, uma festa do cinema francês muito concorrida. Depois, entraram em obras e, parece-me, foi precisamente nesse período que perderam dinâmica relativamente aos novos centros comerciais. Problemas de programação (que não devem ser alheios ao descalabro do Freeport de Alcochete e à insolvência da Medeia Filmes) impediram que os filmes em exibição fossem publicitados como devia e que se fosse de encontro às expectativas do público de Coimbra.

Não podemos prendermo-nos ao passado, mas não posso deixar de pensar que, ao longo da vida, foi nos Cinemas Avenida onde vi mais filmes exibidos. Lembro-me das sessões especiais na sala 1, no piso 7, de onde se saía no Inverno para uma Antero de Quental imersa em nevoeiro de film-noir; lembro-me de chorar e de rir; lembro-me do primeiro e do último filmes que neles vi; lembro-me de ouvir dizer que quem decidia o sucesso ou não de uma sessão era a malta da sessão especial e de sentir algum orgulho nisso; lembro-me de ter havido dois genéricos da Europa Cinemas; lembro-me dos anúncios da Nescafé e do Red Bull; lembro-me das discussões a seguir aos filmes enquanto subia a Sá da Bandeira a pé, discussões que continuavam no Tropical entre tremoços, cervejas, moscatéis e ginger ales; lembro-me de ver o Bringing Out The Dead do Scorsese antes de ir para férias e de comer um gelado com uns amigos que tinham preferido ver o Boys Don't Cry; lembro-me das festas do cinema francês, da sala 1 cheia ao limite do insuportável para ver Wong Kar Wai; lembro-me dos filmes que bisei ("The Truman Show", "American Beauty", "Kill Bill"); lembro-me da retrospectiva Lars Von Trier que me levou a escrever sobre Dogma 95 em História e Estética do Cinema; lembro-me de ver a imagem a ser maior do que o ecrã no "Moonfleet" de Lang; lembro-me do Rasganço dar que falar a uma cidade durante um mês.

Os Cinemas Avenida de Coimbra são, para o bem e para o mal, os meus cinemas. E agora fecharam.

o apelo

Seguindo o conselho do Nuno Seabra Lopes:
Imagine um lugar onde pudesse ler gratuitamente todas as obras do Machado de Assis, obras como "A Divina Comédia", ou ter acesso a histórias infantis.

Um lugar que mostrasse as grandes pinturas de Leonardo da Vinci, ou onde se pudesse escutar, gratuitamente, música em MP3 de alta qualidade.

O Ministério da Educação do Brasil já disponibiliza tudo isto.
Domínio Público
(http://www.dominiopublico.gov.br).

Só de Literatura em língua portuguesa existem 732 obras disponíveis, no entanto estão a pensar em acabar o projecto por desuso, já que o nível de acesso é muito reduzido!
Estão à espera do quê?

a europa

Na loja Vodafone do centro comercial com nome de filme de Fellini, e depois de algumas teclas de computador clicadas, foi-me pedido que voltasse mais tarde, para dar tempo ao cartão de se restabelecer do abalo. Assim, fui à Bertrand e passeei sem destino até encontrar "A Ideia da Europa" de Steiner. Sentei-me e li-o de uma ponta à outra. Dos cinco axiomas que o autor refere, a saber,

1- os cafés,
2- a natureza humanizada, percorrível a pé,
3- as ruas e praças com nomes de artistas e pensadores,
4- a filiação simultânea em Atenas e Jerusalém,
e 5- o sentido escatológico da história,

agradou-me particularmente o primeiro: a ideia de que, todos os dias, depois do almoço, cumpro uma vocação histórica e cultural é, realmente, muito curiosa.
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