"Punch-Drunk Love"
Não consegui ver este filme quando esteve no cinema. E é das histórias de amor mais bem contadas que alguma vez vi.
Primeiro, porque P.T. Anderson não tem um ego inchado e fez a psicanálise à “persona” que Adam Sandler criou para os seus filmes de Domingo à tarde. O “all american boy”, trabalhador e disposto a dar uma coça a qualquer um que se atreva a cruzar o seu caminho (feito com valores tradicionais, como os ladrilhos amarelos d’ “O Feiticeiro de Oz”), carregava em si a angústia de quem quer dar sempre a parecer que tem tudo sob controle. E, com efeito, aqui a harmonia tarda a chegar, ou melhor, chega só quando o momento é devido.
Segundo, porque o neurótico Barry Egan é uma das personagens mais fascinantes que o cinema contemporâneo criou, quer porque está radicalmente ligada ao actor que a personifica (Sandler veste Barry como a própria pele), quer porque ela pertence em exclusivo ao cinema e a nada mais do que ao cinema. O seu fato azul faz dela ser eminentemente visual, o seu percurso, o modo como supera os obstáculos (dos quais não deixa de fazer parte a família castradora, presença recorrente no cinema de Anderson) só pode ter expressão eficaz no cinema, pois só no cinema se pode, por exemplo, garantir uma compreensão da continuidade enquanto se faz uma personagem “saltar” de um Estado para outro sem noção do seu meio de transporte.
Terceiro, porque Anderson sabe que o cinema é imagem e som. Significa isto que a predominância de linhas verticais a rodearem as pessoas, a limpeza dos enquadramentos e o uso expressivo de efeitos de iluminação e de cor (sempre subordinado à história) não são de menosprezar, tal como a concepção musical da montagem e do movimento e o modo de utilização da música – magistral na sequência em que a irmã de Egan o apresenta a Lena, a serena Emily Watson.
E é por tudo isto que Paul Thomas Anderson ainda é dos meus realizadores preferidos.
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